Sobre o funil da formação do atleta de futebol

Você sabia que é mais difícil se tornar um atleta de futebol profissional do que entrar numa faculdade de medicina?

Carlos Pimentel

4/20/20242 min ler

O Brasil é, indiscutivelmente, um dos maiores, senão o maior, em números absolutos, manancial de jogadores de futebol em todo mundo. Aqui “tudo que se planta, dá”. Temos jogadores provenientes dos quatro cantos do país, nas suas cinco regiões e, a cada dia, somos surpreendidos como mais uma “jóia rara” que aparece na várzea (cada dia mais encolhida) e nos clubes de futebol, nas suas categorias de base.

Também nos é conhecido, o constante e crescente êxodo de jovens jogadores que buscam o exterior antes mesmo de brilharem nos campos do Brasil, nas equipes da elite nacional. Só no ano passado o número foi de 1289, contra 1600 no ano de 2020. Isso mesmo, é muita gente não é?

O que pouca gente se dá conta é que isso representa uma minúscula parcela daqueles que tentaram por anos a condição de se tornarem atletas profissionais. Segundo dados estatísticos a cada 3000 meninos e meninas que tentam se estabelecer como jogadores de futebol, um apenas, isso mesmo, 1 somente consegue chegar a condição de atleta profissional capaz de viver e se sustentar através do futebol.

Para comparação, tomemos a profissão mais disputada nos vestibulares do país: Medicina.

No último exame vestibular a maior relação candidato vaga no Brasil, foi no Vestibular da Unesp com exatos 312,7 candidatos por cada vaga oferecida. É aproximadamente 10% da proporção daquilo que observamos para o “vestibular do futebol”.

A questão a ser levantada é:

  1. Esse número do futebol é limitado pelas vagas operacionais e logísticas assim como nas universidades o são?

  2. O baixíssimo aproveitamento estatístico no caso do futebol, seria decorrente da insuficiência qualitativa da mão de obra, ou com a devida licença poética, “pé de obra”?

  3. Seria a relação causa-consequência atrelada a processos falhos e insuficientes de detecção de potencialidades?

  4. Ou ainda, uma inadequada metodologia no decorrer dos anos de formação que as instituições desportivas aplicam e que subestimam o potencial de formação de atletas criativos, autônomos, inteligentes e efetivos?

Aqui acreditamos que os itens 3 e 4 são a maior recorrência e implicam em limitar o potencial de maior aproveitamento de tão farta oferta dos nossos mananciais.

Por mais que evoluímos, e isso é fato, com melhores estruturas e mais bem preparados profissionais, tanto nas avaliações seletivas, quanto nos anos preparatórios dos selecionados, ainda temos um espaço enorme para evoluirmos, otimizando os processos e incrementando a formação e o aproveitamento de jovens talentos.

Uma coisa me parece imprescindível para isso.

Que saibamos usar as “lentes corretas” para avaliarmos o que realmente interessa e abandonarmos a “mesmice” cristalizada da mera reprodução tecnicista, que em muito ainda impera no nosso meio. Enquanto olharmos apenas para a técnica individual ou o vigor físico como parâmetro de escolha, continuaremos a conviver com esse funil de seletividade onde a cada 3 mil sementes plantadas apenas 1 única germina e floresce.